O viés do "não inventado aqui"

André Tamura
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A busca pela re-invenção da roda como barreira para inovação

Constantemente temos contato com projetos, práticas e ideias inovadoras. Procuramos – na medida do possível – explorar, divulgar e “iluminar” algumas delas, na expectativa que sejam praticadas e replicadas por toda a administração pública, em suas três esferas e poderes.
Não somos proprietários dessas ideias e tampouco queremos atuar como uma catraca (pedágio) para que sejam implantadas nas instituições.
Algumas resistências para que as ideias não aconteçam são bem conhecidas: as dificuldades burocráticas, falta de recursos, incapacidade de pessoal e etc. Porém, existe uma outra espécie de barreira pouco explorada que também é prejudicial à inovação, é esta barreira que vou desenvolver nas próximas linhas.

O viés do “não inventado aqui”

*Viés cognitivo é a tendência humana de cometer erros sistemáticos em certas circunstâncias baseados em fatores cognitivos ao invés de evidências.*
A lentidão em adotar ideias inovadoras valiosas (já existentes e praticadas) em algumas instituições, é algo curioso e inexplicável. Essa “forma de burrice” não se limita a nenhum governo específico, esfera ou poder. A inovação não acontece, simplesmente pois “não foi inventada aqui”, nada mais.
Considere que estamos partindo de um pressuposto em que fatores importantíssimos como tecnologia e trabalho estão disponíveis e acessíveis. Mesmo que, em uma observação aprofundada possam estar relacionadas ilicitudes e desvios de conduta(corrupção e favorecimentos de contratos) para que as ideias não aconteçam, não vamos considerar estes elementos na nossa história:

Um novo sistema de gestão

Olá Sr.______ (coloque aqui um nome e um cargo). Você conhece essa solução em que a população auxilia na gestão da sua cidade?
Hmmm, não conheço mas já ouvi falar de algo parecido…
Então, é bem simples de utilizar e a população vai gostar bastante de saber que sua instituição aderiu a plataforma.
Que ótimo (aqui começa o viés)! Vou marcar uma reunião com a área responsável e vamos criar um departamento para desenvolver este projeto (como se não estivesse pronto).
Mas Senhor, o projeto está pronto é só assinar.
Nada disso, temos que dar a “cara da instituição”, vamos nomear uma equipe e eles vão desenvolver algo semelhante, mas a nossa solução vai ser para a população auxiliar na gestão da cidade!
Exatamente o que eu disse no começo Sr… Temos isso pronto para vocês, outras instituições já estão fazendo desse jeito.
Não, é diferente…Obrigado e parabéns pelo trabalho, qualquer coisa entramos em contato. Quando lançarmos a nossa vocês podem ser nossos parceiros, certo?

Qualquer solução, desde que seja a minha

O viés do “não inventado aqui” é pessoal, porém acaba maculando as instituições. Uma maneira de entender o forte apego às próprias crenças, falas, processos e práticas é monitorando o fenômeno dos acrônimos nas instituições. Eles proporcionam a sensação de conhecimento secreto e exclusivo, uma linguagem cifrada única e importante que protege a entrada de outras ideias no círculo fechado de quem está dentro.
Repare em sua instituição (e nas outras) a quantidade de siglas em projetos e departamentos que poderiam certamente trabalhar em conjunto, facilitando a gestão do conhecimento e a inovação. A busca acaba sendo pela autoria e não pela solução real dos problemas.

A solução é compartilhar ao extremo

Em tempos passados quando poucos detinham acesso à informação, até poderia fazer sentido preservá-la na busca pela invenção da roda. Hoje, claramente isso é prejudicial (o debate de patentes médicas ilustra bem esse ponto) especialmente quando falamos de governo e bens públicos, pois somos nós que financiamos o ego dos gestores que sonham em re-inventar a roda. Todo mundo quer ser “o pai da criança bonita”.
Para estimular a inovação até grandes empresários estão abrindo suas patentes. Ao compartilhar, podemos acelerar o processo de criação e alcançar soluções novas e melhores. Vale lembrar que algumas instituições públicas fazem questão de convidar outras para conhecerem seus projetos e compartilhar conhecimento com as outras, e curiosamente são essas instituições que são vistas como modernas e inovadoras.

Por André Tamura

Pai e Marido. Fundador e Diretor Executivo da WeGov. Empreendedor entusiasta da inovação no setor público e das transformações sociais. Estudou Administração de Empresas e Ciências Econômicas. Desde que trabalhou como operário de fábrica no Japão, tem evitado as “linhas de produção”, de produtos, de serviços e de pessoas. Em 2017, foi condecorado com a Medalha do Pacificador do Exército Brasileiro.

5 thoughts on “O viés do "não inventado aqui"

  1. O EGO, COMO UM TERRIVEL AGENTE “DIFICULTADOR” , SEJA ELE O ENORME “EGO INDIVIDUAL” DOS GESTORES-CHEFE, SEJA O “EGO COLETIVO DA INSTITUICAO” ; ESSES TODOS NOS JA CONHECEMOS, E SABEMOS DOS SEUS NEFASTOS EFEITOS .
    POREM, CREIO QUE UM CONCEITO NOVO, ALGO COMO UM “MULTIEGO” , OU “POLIEGO” , DE UMA INSTITUICAO; BASEADO NOS ATUAIS COMPORTAMENTOS DE : COMPARTILHAMENTO, COLABORACAO, DESAPEGO, E EFICIENCIA COLETIVA, PODERIA SER MAIS DIVULGADO E APLICADO NA PRATICA !!
    CREIO QUE PARTE DISSO VCS JA VEM FAZENDO………………….E COM LOUVOR !!!!
    PARABENS !!!

    1. Olá, Ary, ficamos muito gratos com este comentário e ainda mais gratos por reconhecer a WeGov nessa luta contra essa característica dificultadora na luta por melhor desempenho, coletividade e inovação. A

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