É preciso bater tambor

Fernando Ramos
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A sensibilização dos gestores ajuda os projetos em redes sociais

Quem trabalha em governo sabe que um dos gargalos das políticas públicas é a descontinuidade de projetos, não em detrimento dos resultados e/ou questões técnicas, mas por decisões meramente políticas. E na comunicação pública não é diferente. Trabalho no governo há 11 anos, nove deles com internet. E, gestão após gestão, percebo que só sobrevivem projetos que conseguiram tempo suficiente de maturarem, com características de Estado e não tão somente de governo.
Entretanto, como maturar um projeto em redes sociais, um canal e um mercado relativamente novos se comparado com os tradicionais e geralmente com tão pouco tempo para se firmarem? O André falou aqui sobre o significado de uma transição de governo para a o setor de comunicação e suas desagradáveis surpresas. Mas existe outra questão embutida nesse processo e pouco falada: a sensibilização dos gestores.

A sensibilização cotidiana dos gestores é a garantia do lastro do seu trabalho, talvez a chave para a continuidade do setor e, por consequência, das ações, criando raízes para a melhoria do diálogo e transparência com o cidadão nas redes sociais.

Além de todos os preconceitos enfrentados para quem trabalha na área desde falta de seriedade de colegas de outros setores até a pouca literatura acadêmica, levando em conta as demais áreas de comunicação, hoje o maior desafio que os setores digitais de governo enfrentam internamente é mostrar aos gestores que seu trabalho não é supérfluo, mas imprescindível, sobretudo para horizontalizar a comunicação, fazê-la 360º juntamente com a assessoria de imprensa, publicidade e outros.

Vamos exemplificar para entender melhor…

Você trabalha com mídias sociais lá no seu órgão público e está feliz da vida, pois atingiu algumas metas por ter galgado alguns andares: sua página tem muito mais fãs orgânicos do que comprados; você planeja seus conteúdos e eles têm performado bem na rede; a interação com fãs e seguidores realmente acontece; a monitoria ainda é capenga, mas está bem melhor que antes; e até dinheiro para contratação de bons profissionais você dispõe. Em suma, existe reconhecimento. Não chamam mais o seu time de “Os meninos do Twitter”.
Mas digamos que, por critérios políticos, o inevitável acontece: seu ministro ou secretário ou diretor ou coordenador ou assessor cai – isto é, se todos não caírem juntos. Você, conhecedor do funcionamento dessas coisas em governo, começa a pensar que todo o legado está prestes a ir por água abaixo. Afinal, seu chefe te dava carta branca, pois confiava em você, algo que acontece muito em governo – os fluxos são definidos conforme a afinidade entre os cabeças dos times. Ou seja, não é algo da instituição, do Estado, mas proativa da pessoa que estava no cargo naquele período.
Como será com esse novo gestor? Mas calma, ainda pode piorar: o cara ou a moça nova não são muito fãs de redes sociais e acham que Hangout é algo de passar no pão. Então, de repente, você não participa mais de uma reunião vital para seu setor. Dias depois, alguém te diz que a linguagem usada nas postagens – elogiada por seus seguidores e estudiosos da área – é informal demais. Daí, a coisa chega ao ápice do engessamento do processo: o novo ministro ou secretário ou diretor ou coordenador ou assessor quer ver TODO E QUALQUER post de Twitter ou Facebook antes da publicação. Pronto. Aqui jaz um setor de redes sociais, mídias digitais, novas mídias ou seja lá qual for o nome do seu.
Isso provavelmente terá acontecido porque os gestores que permaneceram ou que chegaram não sabem ou não ouviram sobre a importância daquela forma de condução do trabalho de redes sociais, não foram sensibilizados ou não são sensíveis ao assunto. E isso não é uma falha. Como eu disse, se trata do principal desafio a ser superado em social media gov hoje em dia.
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Bom, um dos caminhos para isso é capitalizar os feitos. Traduzindo do “governês”; é preciso bater tambor. Seu time deve ser engajado com os projetos da área e as causas, pois eles também serão porta-vozes espontâneos ao multiplicar os conteúdos em suas redes. O subsecretário adjunto da coordenação da diretoria te procurou para divulgar algo? Escute-o, tente atendê-lo ou desvendar seu anseio.

Após um bom resultado – que para ele, geralmente, são quaisquer 100 compartilhamentos – você o terá catequizado sobre a atuação da equipe nas redes sociais. Um post viralizou ou teve uma performance superior ao usual do perfil, informe seu imediato, ainda que seja um e-mail simples, uma mensagem no “Zap” ou uma conversa de boteco. Sua monitoria nas redes detectou algo antes que os outros setores? Mostre como isso é frequente e sugira um boletim. Se os internautas têm comentado de forma recorrente sobre um tema específico, busque ações em parceria com outros setores, com as redes sociais de outros órgãos. E o mais importante: relatórios. Leia-os. Decifre-os. Melhore-os. Decore-os. Reverbere-os. Já dizia um grande gestor de redes sociais, o que não se pode mensurar, não se pode capitalizar.
Parece óbvio? Não parece, é óbvio. Acontece que na máquina de ansiedade e de moer carne que são as redes sociais, nunca nos lembramos de todos os papéis básicos para amadurecimento dos fluxos, da gestão. Mas estou certo que se você bateu o tambor na hora certa, com certeza terá formado uma massa crítica de todos os lados, sobretudo em sua instituição, do trabalho do time de redes sociais. Assim, será mais difícil o recém-chegado desconsiderar os avanços obtidos.
A boa notícia? A perenidade da área e a cristalização da presença digital do órgão público, o que se traduz na continuidade dos projetos e amadurecimento deles, com características de Estado, e não de governo – e o erário agradece. A má notícia: não é garantia de manutenção do seu posto. Fosse isso, sensibilizar o gestor não seria um desafio. ;D
Fotos: Flickr Frédérique Voisin-Demery

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